22 outubro 2008

Só erra quem faz

O caso envolvendo a adolescente Eloá Pimentel, no ABC paulista, levou o país a debater o preparo da nossa polícia, seja ela paulista, fluminense, capixaba, gaúcha. O episódio ocorrido em São Paulo originou uma saraivada de opiniões manifestadas pelos mais diferentes especialistas. Psicólogos, policiais aposentados, experts em ações táticas. Muito se falou. O que ocorreu em Santo André não difere nem um milímetro sequer do fato acontecido no Rio de Janeiro, no início da década. Para aqueles que não se lembram, o seqüestro do ônibus 174, no Jardim Botânico, na Zona Sul carioca, mobilizou a polícia carioca por mais de dez longas horas e acabou tendo um desfecho trágico. A saga do menino de rua Sandro do Nascimento acabou servindo para inspirar um longa que entra em cartaz nos cinemas brasileiros nesta sexta-feira, dia 24.

Que a polícia brasileira, de um modo geral, carece de um preparo maior, de mais investimentos, não resta dúvidas. O aparelho policial brasileiro sempre esteve associado ao Estado e continua a serví-lo, o que o torna refém de uma forte influência política, que compromete o seu desempenho em momentos de crise.

Niguém falou, mas não podemos nos esquecer que neste domingo (26) teremos o segundo turno das eleições municipais. Na maior capital do país, São Paulo, a disputa se mostra ferrenha. O atual prefeito, Gilberto Kassab (DEM), lidera a corrida, enquanto a candidata do PT e ex-prefeita Martha Suplicy aspira tomar o seu lugar. Kassab é apoiado pelo governador José Serra (PSDB), chefe supremo da polícia paulista, enquanto a ex-ministra do Turismo tem o apoio do presidente Lula, mandatário maior do país.

Alguém, em sã consciência, tem dúvidas de que a ação da polícia no ABC paulista ao longo daqueles 5 dias, em algum momento esbarrou nas urnas? Eu não tenho. O desfecho trágico com a morte prematura da jovem Eloá terá poder para mudar o resultado das urnas no próximo domingo? Não sei e não tenho competência para avaliar. Uma coisa, porém, é certa: a polícia só faz aquilo que o governo ordena. Sempre foi assim. E faltou poder de decisão. A polícia hesitou. Cinco dias são 120 horas, um tempo demasiadamente extenso para solucionar um caso que tinha o agravante do imponderável.

Lindeberg, o pivô da tragédia de Santo André, não buscava nenhuma vantagem financeira, não estava ali para propor a troca das reféns por dinheiro ou para exigir um helicóptero para sua fuga. Estava sim para reparar, sob sua ótica patológica, uma injustiça. Eloá fora injusta, raciocinou Linderberg, ao romper o namoro com ele, impondo-lhe um sofrimento que Lindeberg acreditava ser difícil de ser superado. À polícia, portanto, não restava muita coisa, não havia muito o que negociar. E alguém, entre tantos especialistas de plantão, deveria ter soprado isso no ouvido do comandante da polícia. E isso, definitivamente, não ocorreu.

Que a morte da jovem Eloá sirva de exemplo para futuras ações do gênero. Que o gesto de solidariedade demonstrado por sua família, que resolveu doar os órgãos da adolescente, em que pese estar ainda sob os efeitos da dor, sirva de exemplo para que as pessoas não precisem mais amargar anos de espera na fila de transplantes em busca de um órgão que pode salvá-las da morte.

Quanto à polícia. Ela é composta por seres humanos, por homens, mulheres, chefes de família, que como todos nós, se equivocam e hesitam. E a imprensa da qual faço parte, por sua vez, contribui equivocadamente, sob a argumentação da liberdade da informação, para a glamourização de quem rompeu a linha da legalidade. Botar Lindemberg ao vivo, por telefone, para narrar sua desventura amorosa numa emissora de rádio ou TV, me parece fora de propósito. Soa como incentivo, troféu dado a quem deixou o anonimato, mesmo que por apenas 120 horas.

A lição maior que me parece indelével: erros só comete aquele que se aventura a fazer. Quem se omite, não tem como sorver o sabor da conquista, do êxito ou até mesmo do fracasso, da frustração.

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