16 junho 2009

Tecnologia já

Os puristas vão se apressar em dizer que a polêmica, o disse-me-disse, fazem parte da cultura do futebol e que ajudam a fincá-lo no coração dos apaixonados pelo esporte. O lance, no minuto final do jogo de estreia da Seleção Brasileira contra o Egito, pela Copa das Confederações, na África do Sul, é uma oportunidade singular para fazer com que o debate sobre a questão do emprego da tecnologia durante as partidas de futebol fique ainda mais acalorado. Exemplos do uso da tecnologia como ferramenta para dissipar dúvidas já ocorrem no turfe, no basquete americano, na natação, no atletismo.

Quis o destino que a equipe pentacampeã do mundo, aquela que reúne um elenco de estrelas milionárias, fosse a protagonista da discussão: a pergunta em questão é se o árbitro britânico fora ou não avisado pelo ponto eletrônico de que o atleta egípcio impedira com o braço direito aquilo que seria o gol da vitória do Brasil, no minuto final da partida.

No dia seguinte, a FIFA ignorou os protestos das equipe africana, garantindo que o árbitro fora avisado por um dos seus assistentes - na minha época chamava-se bandeirinha.

Ora bolas! Chega de hipocrisia! Que o juiz fora avisado do pênalti pelo ponto eletrônico não resta dúvidas. O que causa espécie é por que a FIFA, em que pese já ter se manifestado contra o uso do aparelhinho providencial, não impede os juízes de usá-lo.

Apesar da pífia atuação do Brasil no segundo tempo da partida, a equipe acabou sendo beneficiada pela tecnologia, saindo de campo vitoriosa, apesar do desempenho heroico da equipe egípcia na etapa final.

Maus lençóis maranhenses

A entrevista do senador José Sarney à Folha de S. Paulo a propósito dos mais recentes escândalos envolvendo o Senado Federal é um libelo contra o senador maranhense. Sarney, com toda sua experiência política e inegável sabedoria, não conseguiu fazer com que sua imagem fosse descolada de responsabilidade na farra dos chamados atos secretos. As nomeações clandestinas de parentes dos senadores foram denunciadas ao país pelo jornal Estado de São Paulo. Sarney, definitivamente, está em maus lençóis. O mais recente escândalo envolvendo o Senado está fulminando o que resta da imagem do Congresso.

A reportagem do Estadão é, seguramente, uma fortíssima concorrente ao Prêmio Esso de Jornalismo deste ano. A entrevista (leia abaixo) com o Presidente do Senado foi feita pelos jornalistas Fernando Rodrigues e Valdo Cruz, da Folha de S. Paulo.



FOLHA - Como o sr. avalia a onda de escândalos envolvendo o Senado?
JOSÉ SARNEY - A vida sempre me reservou desafios. A crise da democracia representativa está atingindo todos os Parlamentos no mundo inteiro.

FOLHA - Por culpa de quem?
SARNEY - A notícia em tempo real transformou o Parlamento, ele fica quase envelhecido. Em face disso há uma divergência de saber quem realmente representa o povo. É a mídia eletrônica, são as ONGs, é a sociedade civil ou os representantes eleitos? Esse é o grande problema que estamos vivendo.

FOLHA - O sr. contratou a Fundação Getúlio Vargas para fazer uma reforma administrativa no Senado. Agora, o sr. também tem aparecido em meio a acusações de comportamento impróprio. O que aconteceu?
SARNEY - Olha, eu acho que eu tenho um nome que deve ser julgado com respeito pelo país. Eu tenho uma biografia, nunca alguém associou minha vida pública ao nepotismo. Os fatos que colocaram estou mandando examinar. O que estiver errado, se corrija. Se eu tiver algum erro, eu sou o primeiro a corrigir. Mas acho que nunca conduzi de outra maneira que não fosse com correção.

FOLHA - E o caso do seu neto, contratado pelo senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA)?
SARNEY - Depois de eu ter sido tudo, se eu fosse acusado de ter nomeado um neto era realmente um julgamento que seria injusto. Eu não pedi ao senador. Disse isso e ele confirmou. E, se ele tivesse me consultado, teria sido o primeiro a dizer não.

FOLHA - Quando o sr. soube, qual foi sua reação?
SARNEY - Ele próprio saiu. Já era um problema a ser administrado pelo Cafeteira. O que a imprensa tem de entender é que aqui dentro do Senado temos 81 repartições. Cada senador é o chefe do seu gabinete. Quem nomeia é ele.

FOLHA - Seu neto saiu por conta do nepotismo, mas entrou no lugar a mãe dele. O sr. soube disso?
SARNEY - Eu não sou responsável pelo gabinete do Cafeteira.

FOLHA - O que o sr. acha da afirmação do senador Cafeteira de que nomeou seu neto por dever favores a seu filho, Fernando Sarney?
SARNEY - Você acha que eu, como presidente do Senado, tenho minha biografia, vou discutir uma coisa dessa? Não vou discutir um assunto desse. Minha resposta para vocês é essa.

FOLHA - E os outros casos relacionados ao sr.: duas sobrinhas empregadas em gabinetes de senadores, de Roseana Sarney (PMDB-MA) e de Delcídio Amaral (PT-MS).
SARNEY - Esse é um caso que está sendo estudado, porque parece que ele foi colocado agora. Eu pedi para ser investigado. Eu acho que há uma certa armação no caso da Roseana, na publicação de que foi ato secreto. Esse problema, que não é meu, a chefe de gabinete dela diz que os dados não conferem. Está sendo analisado.

FOLHA - E do Delcídio?
SARNEY - Do Delcídio, eu realmente pedi a ele, uma sobrinha da minha mulher, funcionária de carreira do Ministério da Agricultura, mudou-se para Mato Grosso do Sul, pedi que ela fosse requisitada para trabalhar no gabinete dele. Eu acho que não tem nenhum erro em ter feito esse pedido a ele.

FOLHA - Há atos secretos?
SARNEY - Estou convencido de que há muitas falhas, que pode ter havido não publicações. Vamos examinar.

FOLHA - O ex-diretor-geral do Senado Agaciel Maia disse que os senadores conheciam os atos secretos. É correta a afirmação?
SARNEY - Eu nunca soube.

FOLHA - Mas o que aconteceu? Os atos não eram públicos...
SARNEY - Não sei. Isso nós estamos tentando apurar.

FOLHA - Quando Agaciel deixou a direção-geral do Senado, o sr. o saudou pelos serviços prestados. Mantém a mesma opinião sobre ele?
SARNEY - É um assunto de ordem pessoal, de valor, que acho que não cabe numa entrevista.

FOLHA - Até agora, nenhum congressista foi punido e poucos devolveram dinheiro gasto indevidamente. Isso não produz uma sensação de impunidade?
SARNEY - A população pode até contestar a validade do Congresso. A democracia não vive sem Parlamento. E Parlamento fraco, desmoralizado, é desejo de segmentos da sociedade.

FOLHA - Esse enfraquecimento não ocorre por causa da resposta tímida dos congressistas? No episódio do auxílio-moradia pago indevidamente, inclusive ao sr., não seria o caso de todos devolverem o dinheiro?
SARNEY - Nunca tinha recebido auxílio-moradia. Recebi por oito meses. Mandei interromper ao saber. Quanto aos outros, cada um fará o seu julgamento.

FOLHA - O sr. devolveu o dinheiro ao Senado?
SARNEY - Vou ressarcir. Está em estudo como é que se deve proceder. Isso será um gesto pessoal, meu.

FOLHA - Os outros estão obrigados a devolver o dinheiro?
SARNEY - Não. Isso é uma decisão pessoal. Acho que é da lei. Eles estão usufruindo benefício que é extensivo ao funcionário público de maneira geral.

FOLHA - O Congresso é o maior responsável pela crise?
SARNEY - Sim, claro que o Congresso tem responsabilidade. Estamos num período de exaustão do modelo de democracia representativa. Há uma tendência de buscar uma democracia direta. Tudo aponta nesse sentido.

FOLHA - O sr. se arrepende de sua candidatura a presidente do Senado? Pensou em renunciar? SARNEY - Não. Minha vida foi sempre feita de desafios. Vou exercer até o fim.

FOLHA - De todos os desvios que estão acusando o sr., qual o sr. considera erro mais grave? SARNEY - Não tenho nenhuma responsabilidade sobre o auxílio-moradia. No caso da minha sobrinha, eu estou assumindo. Não cometi erro nenhum. Querer julgar toda a minha vida por eu ter pedido por uma sobrinha de minha mulher, acho extremamente errado, uma injustiça em relação a mim. Eu deveria ser julgado com mais respeito. Sou o parlamentar mais antigo neste país. Estou fazendo um esforço grande na minha idade.

FOLHA - Está sendo sabotado?
SARNEY - Não descarto essa hipótese. Até porque falam dos atos secretos, mas só aparecem os meus. Não tenho provas.

O terrorismo na agenda brasileira

ANDRÉ LUÍS WOLOSZYN

Com a publicação no "Diário Oficial da União" da portaria 22 do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, que cria o Núcleo de Coordenação das Atividades de Prevenção e Combate ao Terrorismo, um grupo de estudos de alto nível para acompanhar o cenário internacional e avaliar possíveis ameaças de terrorismo, o governo brasileiro dá mostras de avanços significativos em matéria de segurança nacional, notadamente em um assunto que há pouco tempo era considerado um tabu. Simplesmente afirmar, como alguns, que estamos imunes a esse fenômeno é uma temeridade, pois diversos fatores da conjuntura nacional e internacional têm contribuído para a expansão das redes terroristas, alguns dos quais independentemente da vontade de governos e nações.

Na conjuntura internacional, destacamos a própria globalização econômica e política, o crescimento do comércio internacional de bens e serviços e do transporte internacional de passageiros, o desenvolvimento das redes financeiras mundiais, o aumento da imigração e, consequentemente, de grupos étnicos heterogêneos em diferentes países, o desenvolvimento das redes de comunicações e a transformação das metrópoles em cidades cosmopolitas.Na conjuntura nacional, existe, particularmente no Brasil, um potencial de ocorrência se considerarmos algumas peculiaridades.

Em primeiro lugar, as características geográficas: grandes extensões de fronteiras terrestres dispostas em nove tríplices fronteiras, totalizando aproximadamente 17 mil km e extensão marítima de 8.000 km, com deficiências de recursos humanos, materiais e tecnológicos para o patrulhamento dessas áreas.Em segundo lugar, o fato de não possuirmos uma legislação específica e tipificação penal para o crime de terrorismo, embora a Constituição Federal o repudie, considerando-o crime inafiançável e insusceptível de graça ou indulto.Em terceiro lugar, o dinamismo e o caráter transnacional dos crimes considerados conexos ao terrorismo, como o narcotráfico, o tráfico de armas, a falsificação de moeda e de documentos e a lavagem de dinheiro, dentre outros, praticados por organizações criminosas e que dão suporte a ações terroristas.Por fim, o compartilhamento de fronteiras com países que possuem grupos terroristas ativos, como as Farc (Colômbia) e o Sendero Luminoso (Peru), ambos envolvidos também com o tráfico de drogas e com potencial para infiltração nas favelas brasileiras.

A soma desses fatores inter-relacionados acaba por fortalecer as probabilidades de o país ser, como apontam alguns especialistas, transformado em um atrativo para a criação de redes de proteção internacional para esses criminosos.Isso facilitaria e estimularia a utilização de nosso território como base para o planejamento de ações e atentados em âmbito global, além da possibilidade de homizio de integrantes de grupos terroristas de diversos matizes -separatistas, nacionalistas, radicais e extremistas.Também aumenta, seguindo uma tendência que ocorre em países desenvolvidos ou em desenvolvimento, a possibilidade de um ataque virtual ou ciberterrorismo a redes de computadores de empresas privadas e governamentais, principalmente em razão de estarmos cada vez mais dependentes dessas redes nos serviços básicos à população e em estágio avançado de pesquisa e desenvolvimento de tecnologias de ponta em vários campos do conhecimento científico, como na exploração da camada pré-sal e na área de biocombustíveis.

Nesse contexto, a iniciativa do Gabinete de Segurança Institucional só pode ser elogiável, independentemente de saber se a criação do núcleo se deve ao recente episódio da prisão pela Polícia Federal de suposto integrante da rede terrorista Al Qaeda em São Paulo, às repercussões diplomáticas do caso de asilo político a Cesare Battisti, membro de reconhecido grupo terrorista italiano, ou até mesmo às pressões de uma opinião pública atemorizada pelo recrudescimento de atentados em outros países.O importante é que os interesses nacionais venceram a ideologia e, com essa iniciativa, as autoridades governamentais acabaram por não descartar a hipótese de estarmos no círculo interno de atuação do terrorismo internacional, tese que vem sendo defendida há muito por especialistas e analistas da área de inteligência.


ANDRÉ LUÍS WOLOSZYN, 44, é analista de inteligência estratégica pela Escola Superior de Guerra, especialista em terrorismo pelo Colégio Interamericano de Defesa (EUA) e em ciências penais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

*Artigo publicado na edição desta terça-feira (16/06) da Folha de S. Paulo

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