Policiais federais, em conflito com a chefia e em aliança subterrânea com espiões do governo, armam uma rede para apanhar um banqueiro suspeito. A cúpula policial revida, expurga desafetos e consegue um mandado para invadir escritórios da agência de espionagem, onde apreende documentos e bancos de dados.
A trama, um aglutinado de lugares-comuns dos suspenses de espionagem, foi 100% rodada no Brasil e não tem nada de fictícia. Foi produzida pela acefalia que dá livre curso à batalha grupal em que estão engolfadas a Polícia Federal e a Agência Brasileira de Inteligência.
O sigilo de "dados de inteligência necessários à defesa do Estado", compilados por arapongas da Abin, ficou vulnerável, argumenta o advogado-geral da União -e adiciona ao rocambole o toque de ameaça à segurança nacional que não pode faltar nesse tipo de enredo.
A batida dos policiais na agência também "desmoraliza" a Abin em sua relação com "países de vital interesse estratégico para o Estado brasileiro", reclamou um indignado general Jorge Felix, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, em carta ao ministro da Justiça, Tarso Genro, revelada por esta Folha. Afinal, que governo gostaria de trocar informações de inteligência com Brasília se esses dados estão sujeitos à devassa policial?
De fato, é inaceitável que a Abin seja alvo de intrusões da Polícia Federal. Mesmo no caso de uma nação de tradição pacífica como o Brasil, é preciso sustentar um serviço de inteligência e contra-espionagem -para questões de natureza econômica e ambiental por exemplo- de caráter reservado, embora sujeito a prestações de contas a comitês parlamentares.
Mas as distorções suscitadas por esse caso são generalizadas. Antes de ter escritórios invadidos, o descontrole da Abin permitiu que 60 de seus agentes, lotados na sede e noutros 11 birôs regionais, participassem de uma investigação da Polícia Federal, a chamada operação Satiagraha. Como se não bastasse tamanho abuso -agentes da Abin não podem exercer função policial-, ainda pesa sobre servidores ligados seja à Abin seja à PF a suspeita de terem realizado escutas telefônicas ilegais.
A guerra de grupos ganhou vida própria a partir das entranhas de duas poderosas instituições federais. Os ministros que ocuparam a pasta da Justiça na gestão Lula nada fizeram para interromper a balcanização da Polícia Federal. Já passa da hora de o presidente da República restabelecer a autoridade do governo sobre as duas repartições.
*Editorial publicado hoje (21) na Folha de S.Paulo
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